Nova versão do clássico será apresentada dias 27 e 28 de outubro, no Teatro Guararapes, com ingressos a R$ 25
Em dezembro de 1975, Bibi Ferreira subia ao palco do Teatro Tereza Rachel (Rio de Janeiro) para estrear “Gota D’Água”, transposição da tragédia grega Medeia, de Eurípedes, para a realidade de um conjunto habitacional do subúrbio carioca. Com um arrojado texto em versos de Chico Buarque e Paulo Pontes e canções como “Basta um Dia”, o espetáculo marcou época e se tornou um clássico moderno do teatro brasileiro. Mais de quatro décadas depois, a história voltou à cena com uma adaptação inédita do diretor Rafael Gomes. Batizada de “Gota D’Água [a seco]”, a nova versão estreou no Rio de Janeiro em maio de 2016. Contemplado pelo edital da BR, o espetáculo chega ao Recife dias 27 e 28 de outubro, no Teatro Guararapes. No palco, Laila Garin e Alejandro Claveaux são acompanhados por cinco músicos, sob a direção musical de Pedro Luís. Ingressos, a R$ 25 e R$ 12,50, já estão à venda.
Como ‘a seco’ do título já indica, a montagem busca chegar à essência da história, através dos embates entre os protagonistas, Joana e Jasão, ainda que outros personagens do original também apareçam na adaptação. Mesmo com parte da trama sociopolítica reduzida na versão, Rafael Gomes reitera que a sua leitura da peça é focada em sua natureza política, cruelmente atual. “A ‘Gota D’Água’ original possui uma trama política bastante latente em seu embate entre opressores e oprimidos. Ao concentrar a história em Joana e Jasão, em suas ideologias, ações e sentimentos, eu gostaria ainda assim de falar sobre essa política mais essencial da vida, do dia a dia, essa que a maioria das pessoas sublima, esquece ou finge que não é com elas, achando que ser político é somente saber apontar o dedo para o adversário e se manifestar eventualmente por aquilo que interessa, de forma um tanto o quanto individualista”, afirma o diretor, que manteve toda a estrutura formal da peça e inseriu novas canções e pequenas citações de letras de Chico Buarque em algumas passagens do texto.
“Gota D’Água [a seco]” é o primeiro espetáculo que Rafael Gomes dirigiu fora de sua companhia, a Empório de Teatro Sortido, de onde trouxe alguns colaboradores para esta montagem, como o cenógrafo André Cortez (Prêmio Shell por “Um Bonde Chamado Desejo”, 2015) e o iluminador Wagner Antônio. Rafael foi convidado pela produtora Andréa Alves, da Sarau Agência, e por Laila Garin para embarcar no projeto.
Estrela de “Elis – A Musical”, Laila experimenta agora um novo desafio em cena: além de interpretar a mítica personagem eternizada por Bibi Ferreira, dá voz a músicas que não faziam parte da peça original, como “Eu Te Amo”, “Baioque” e “Cálice”. Revelado no projeto “Clandestinos”, Alejandro Claveaux interpreta o personagem que já foi de Roberto Bonfim e Francisco Milani (na temporada paulistana, em 1977).
TRAGÉDIA CARIOCA, EMBATES UNIVERSAIS – Chico Buarque e Paulo Pontes começaram a trabalhar no texto original a partir de uma transposição que Oduvaldo Vianna Filho (1936-1974) havia feito para a televisão. A feiticeira Medeia virou Joana, moradora do conjunto habitacional Vila do Meio-Dia, mãe de dois filhos, frutos de seu casamento com Jasão, alguns anos mais novo do que ela. Compositor popular, Jasão é cooptado pelo empresário Creonte, que o ajuda a fazer sucesso, e termina por largar Joana para se casar com a filha do milionário. A trama passional – que culmina na vingança de Joana – tem como pano de fundo as injustiças sociais pelas quais os moradores do local passam, vítimas da exploração de Creonte, todo-poderoso da região.
Por conta deste acúmulo de tensões, Rafael Gomes elegeu o embate como o conceito central de sua montagem. Não somente o embate amoroso, que está no cerne da trama do casal, mas também o social, em um sentido mais amplo, e, principalmente, o íntimo. “São as batalhas internas a que as circunstâncias externas nos sujeitam. Jasão no conflito entre o que está ganhando e o que está deixando para trás, assim como Joana na decisão entre ir às últimas consequências para se vingar ou simplesmente seguir vivendo – o embate entre o humano e o divino, o terreno e o espiritual’, conclui o diretor.
Com esta nova e enxuta adaptação, as músicas que não estavam no original entram justamente para servir à dramaturgia, ao contar partes da história, revelar melhor o caráter e as contradições das personagens, além de amplificar alguns contextos e situações que precisaram ser sumarizados. A entrada de Pedro Luís na direção musical vem ao encontro da vontade de não fazer necessariamente um musical tradicional. “É um arejamento, um olhar diferente. Pedro fez com as canções, todas já tão conhecidas e consagradas, o que eu pretendo fazer com a dramaturgia: dar uma nova dimensão, jogar uma luz por um lado que não estamos acostumados a ver. Isso não implica em uma ambição de ‘melhorar’ nada, apenas de tentar pensar e criar por um caminho menos óbvio”, ressalta Rafael.
MÚSICA, LETRA E TEATRO – Laila Garin sempre teve a carreira teatral atravessada pela música, seja em shows paralelos ou na série de espetáculos musicais que protagonizou recentemente. Após ter iniciado a vida artística em Salvador, sua cidade, ela se mudou para São Paulo e trabalhou com Luiz Carlos Vasconcelos, da Cia. Piolim, antes de ficar por sete anos na Casa Laboratório, dirigida por Cacá Carvalho e a Fondazione Pontedera. Após o período na capital paulista, fixou residência no Rio de Janeiro, onde estrelou “Eu Te Amo Mesmo Assim” (2010), musical supervisionado por João Falcão, diretor de “Gonzagão – A Lenda” (2012), do qual Laila fez parte por algumas temporadas.
A sua recriação do mito Elis Regina em “Elis – A Musical” (2013) provocou um verdadeiro fenômeno teatral de público e crítica, coroado com todos os principais prêmios de atuação do País: APCA, APTR, Bibi Ferreira, Cesgranrio, Quem, Reverência e Shell. No último ano, ainda esteve em “O Beijo no Asfalto”, versão musical de Claudio Lins para o clássico de Nelson Rodrigues, e estreou na TV na novela “Babilônia”, de Gilberto Braga, Ricardo Linhares e João Ximenes Braga.
Andréa Alves abraçou a empreitada de revitalizar a tragédia e as canções de “Gota D’Água” após produzir a recente montagem de “Ópera do Malandro”, em cartaz por quase dois anos com enorme sucesso popular. À frente da Sarau Agência desde a sua fundação, em 1992, também é a responsável pelo Festival Villa-Lobos e os musicais “Grande Otelo – Eta Moleque Bamba!”, “Gonzagão – A Lenda” e “Auê”, nova criação da Cia. Barca dos Corações Partidos. Da mesma forma, a música sempre foi um elemento determinante no teatro de Rafael Gomes. Seu texto de estreia, “Música Para Cortar os Pulsos” (prêmio APCA de Melhor Peça Jovem, 2010), era estruturado a partir de citações musicais e trechos de letras, enquanto nos espetáculos seguintes a trilha sonora sempre exerceu um relevante diálogo com a dramaturgia, caso de “Gotas D’Água Sobre Pedras Escaldantes” (2014) e “Um Bonde Chamado Desejo” (2015), que acaba de lhe render o Prêmio Shell de Melhor Direção. Ele considera “Gota D’Água [a seco]” seu primeiro musical, embora prefira pensar na montagem como uma “peça com música”.
“Quando Andréa e Laila me convidaram para este trabalho, para além de todo deleite imediato que seria trabalhar com ambas, a ‘questão Chico Buarque’ também calou fundo. Não só pelos motivos óbvios, de Chico ser esse artista gigante, mas porque minha trajetória no teatro está carimbada pela obra dele. A primeira peça que fiz na vida foi como assistente de direção e dramaturgista de ‘Calabar’, em 2008, numa montagem dirigida por Heron Coelho. E já dirigi uma releitura de ‘Cambaio’, que chamamos também de ‘Cambaio [a seco]’, em caráter de evento, com apenas sete apresentações”, conta Rafael, que sempre foi admirador de musicais, “de Brecht a Sondheim, passando pelos filmes da Disney e Bob Fosse. Espero que este seja o primeiro de vários”, ressalta.
Ficha técnica:
GOTA D’ÁGUA [A SECO] – De Chico Buarque e Paulo Pontes. Adaptação e direção: Rafael Gomes. Com Laila Garin e Alejandro Claveaux. Músicos: Antônia Adnet, Elcio Cáfaro, Marcelo Muller, Pedro Silveira e Dudu Oliveira. Direção Musical: Pedro Luís. Cenografia: André Cortez. Iluminação: Wagner Antônio. Figurinos: Kika Lopes. Direção de Produção: Andréa Alves. Diretor Assistente e Direção de Movimento: Fabrício Licursi. Design de Som: Gabriel D’angelo. Preparação e Arranjos Vocais: Marcelo Rodolfo e Adriana Piccolo. Assistente de Direção Musical: Antônia Adnet. Assistente de Cenografia: Rodrigo Abreu. Coordenação de Produção: Leila Maria Moreno. Produção Local: Art Rec Produções
SERVIÇO
Gota D’Água [a seco]
Dia 27 de outubro (sábado), às 22h
Dia 28 de outubro (domingo), às 19h
Teatro Guararapes – Centro de Convenções de Pernambuco
Informações: (81) 3182.8020
Classificação: 16 anos
Duração: 100 minutos
Gênero: Musical
Ingressos:
R$ 25 (inteira) e R$ 12,50 (meia)
* À venda na bilheteria do teatro (segunda a sábado, das 9h às 17h – sem cobrança de taxa de conveniência), lojas Ticketfolia dos shoppings Recife, RioMar, Tacaruna e Guararapes e www.eventim.com.br
Este projeto foi aprovado pelo edital de circulação da BR e se apresentará nas cidades de Campinas, Fortaleza e Recife.