O neurocientista, psicanalista e psicopedagogo Fabiano de Abreu diz que o ensino à distância é uma realidade a que todos, principalmente o governo, terá que se adaptar
Os tempos que vivemos são tempos de mudança. Há novas realidades a que nós temos que adaptar, novas formas de viver e de experienciar. O ensino à distância é uma dessas novas etapas que teremos que integrar nas nossas vidas.
Segundo o neurofilósofo, psicopedagogo e especialista em estudos da mente humana, Fabiano de Abreu, a pandemia da covid-19 veio mostrar que, o nosso mundo tecnológico ainda apresenta falhas quando algo surge inesperadamente. No entanto o tempo é de adaptações rápidas e eficazes.
“Em tempos de pandemia e quarentena, vimos a necessidade repentina da inclusão educacional online. E foi então que percebemos que não estávamos tão adiantados como pensávamos. As plataformas de ensino à distância não estavam preparadas para uma mudança sem planejamento como uma chave de liga e desliga acionada com uma alavanca.”, reflete.
Esta nova forma de viver condicionou toda uma sociedade desde os alunos, aos pais, aos professores e educadores. Ninguém ficou de fora. Como nos alerta Fabiano, “Essa mudança afetou uma rotina em que, muitos dos pais apenas se preocupavam em levar as crianças para escola e depositar a confiança na instituição para todo o resto. Com o fechamento das escolas, o ensino online tornou-se uma realidade em que, não só a escola teve que se preparar de forma rápida e eficiente, como também houve uma necessidade de atenção dos pais para com os seus filhos.”.
Ainda segundo o especialista, há mudanças que se vão transformar em aspetos positivos e outras que terão de se tornar obrigações. Fabiano começa por destacar a aproximação de pais e filhos na elaboração de tarefas conjuntas.
“Eu vejo não só alguns pontos positivos para o ensino à distância em relação ao relacionamento pais e filhos como também uma necessidade dentro de uma realidade na qual, a pandemia, forçou para que nos adotássemos o quanto antes. Vou explicar os pontos que, na minha visão, o ensino online torna-se crucial e uma realidade na qual temos que, desde já, não só nos adaptar, mas o governo deve implantar.”, explica o filósofo.
Nesse sentido, Abreu elabora uma lista sobre as mudanças que terão de ser analisadas e pensadas por toda a sociedade, desde a escola, ao governo e no seio familiar. Segundo Abreu, o governo tem que pensar em estratégias para disponibilizar internet e computadores para todos e criar plataformas de ensino viáveis. Além disso é necessário formar os professores para esta realidade. Segundo o especialista temos que pensar a longo prazo no caso de existirem outras pandemias. A covid-19 deve servir como uma preparação para o futuro.
Segundo ele as etapas necessárias são as seguintes:
Internet para todos – Todos os países deverão se preocupar com a potência e estabilidade da internet e que ela chegue a todos. Educação online exige uma boa internet até mesmo pela questão dos vídeos, arquivos, espaço de armazenamento e transmissões em directo como vídeo aula ao vivo. O governo deve não só fornecer internet gratuita, como também controlar o valor da internet no mercado por ser um bem de necessidade pública.
Plataforma de ensino – As instituição devem se preocupar com o tipo de plataforma para as aulas online, a necessidade de ser 100% online já é uma realidade. A plataforma tem que ter capacidade de ter não só apostilas, arquivos em pdf, como também vídeo aula e transmissões ao vivo, em direto, entre alunos e professores como uma sala de aula. Também é necessário um sistema de fiscalização para o dia da prova, isso é possível quando o aluno sabe que está sendo observado. Tem como o professor conseguir ter em um mesmo plano de tela todos os alunos, basta uma tela grande que divida-os em quadrados em uma tela.
Computadores para todos – É de responsabilidade do governo que todos tenham acesso a um bom computador. Não só fornecendo aos de baixa renda, mas também auxiliando na isenção de impostos para esses tipos de aparelhos eletrônicos assim como investindo na fabricação dos equipamentos no país.
Preparação dos professores – O governo tem que repensar seu método de ensino acrescentando métodos para ensino à distância onde o professor deve se portar de maneira diferente do presencial. A organização em relação a comunicação para que mais de um aluno não fale ao mesmo tempo. Organização e controle em relação a comunicação em geral. Utilizar de técnicas de posicionamento de câmera em que o aluno se sinta na sala de aula e não sinta a diferença tendo que se adaptar e sim, sentir-se dentro do padrão visual que está acostumado. Muitos YouTubes dão boas aulas com quadros em que escrevem o que está ensinando e se posicionando de maneira que não atrapalhe a visão do aluno. A necessidade de ser criativo e chamar a atenção do aluno também é maior. Pois há maiores chances do aluno se distrair no seu ambiente de casa. Pode passar um animal de estimação, um outro membro da família, podem ter objetos próximos que o distraia ou até mesmo notificações no telefone que desviem a atenção. Os pais também tem que ajudar na configuração do aparelho para que diminua as possibilidades de desvio de atenção. Vejo vídeos de professores no YouTube que prendem mais a atenção do que muitos professores que dão aulas presenciais. Não podemos esquecer que o YouTube e vídeos na internet é algo que chama a atenção das crianças mais do que uma aula presencial. Tem que aproveitar isso e ser criativo para criar vídeos como muitos criam e tem milhares de views.
Necessidade do ensino à distância
Outras pandemias – A ciência já revelou diversas vezes que as possibilidades de pandemia são reais. O mundo globalizado, o deslocamento dos povos e o número de habitantes cada vez maior e aglomerado em grandes centros aumentam as possibilidades de outros surtos, por isso, o ensino à distância é um ótimo meio de evitar a proliferação já que milhares estarão a estudar em casa e não a se deslocar promovendo maior contato físico.
Aproximação dos pais – Estamos vivendo uma era de distanciamento dos pais com os filhos. A necessidade dos pais de trabalharem cada vez mais devido ao alto consumo, conseguirem bancar altos impostos e manter um melhor bem estar da família fez com que houvesse uma distância dos pais com os filhos e isso está acarretando em vários problemas; o acompanhamento dos pais na educação dos filhos é primordial para o melhor desenvolvimento da criança, a falta deste contato acarreta em problemas na adolescência e na fase adulta. É da nossa natureza biológica, está impresso em nosso código genético essa necessidade do cuidador, dos pais para cuidarem e educarem. Até a total formação do cérebro, a criança precisa deste apoio racional dos pais para a sua educação e acompanhamento ou isso afetará na fase adulta. O ensino a distância obrigou aos pais a dedicarem mais tempo para os seus filhos e neste método de ensino, é essencial a ajuda dos pais não só para que o aluno possa se adaptar, mas também pelo esquecimento e falta de vontade já que o ambiente caseiro o torna mais relaxado. Não podemos esquecer que a nossa casa é um local de descanso e acaba proporcionando essa ideia inconsciente causando um relaxamento. Temos que adaptar uma nova realidade inclusive, se puder, criando um ambiente de estudos para o filho não esquecendo a sua postura ao sentar pois influencia na falta de relaxamento.
Comportamento dos pais – Agora os pais podem estar mais a par do que os alunos aprendem e eles tem que criar métodos e uma rotina para auxiliar os filhos. Método de leitura em voz alta, pedir para o filho ensinar o que aprendeu, pedir para que reescreva o que leu. Quer melhor do que nós adultos podermos relembrar ou aprender coisas novas? E acompanharmos o filho e não passar vergonha quando ele disser o que aprendeu e não sabermos. Esta aliança com o filho também e importante para criação e pela confiança do filho com os pais. Muitos casos de jovens que usam drogas está relacionado a ausência dos pais ou falta de confiança e liberdade para contar a vida aos pais e os pais poderem dar conselhos antecedendo a possibilidade de uma ação errada que leve ao prejuízo do jovem. A proximidade trás a confiança de uma amizade e quando temos conhecimento dos problemas dos filhos, ajudamos orientando através da nossa experiência evitando assim, o pior.
Meio ambiente – A quarentena provou que a poluição diminuiu e o meio ambiente será de necessidade global ou a terra se tornará inabitável no futuro. Se vivemos para criar nossos filhos e netos, não faz sentido não pensar nos que virão depois deles. A educação à distância então se tornará um método obrigatório e temos que desde já nos acostumarmos com ela.
Sem pressão – O ensino à distância é no tempo do aluno, sem pressão, dando tempo para que ele possa criar métodos de aprendizagem mais eficazes que num tempo corrido. Claro que há sempre prazos a cumprir, mas já o treina para o mercado de trabalho que funciona da mesma maneira. O aluno também pode rever a aula e revisar o conteúdo.
Segundo o filósofo, o método de ensino tem que ser revisto e alerta que podemos estar a usar uma metodologia obsoleta.
“O ensino presencial já é coisa do passado e os benefícios do ensino online são maiores. Ele garante a possibilidade de obrigar ao aluno a aprender outras línguas para cursos no estrangeiro e globaliza o mundo já que a pessoa pode fazer cursos no exterior e conseguir emprego em outro país. Também aumenta a concorrência com a possibilidade de ensino em mais de um país reduzindo assim o valor da mensalidade. Não adianta não querer avançar por medo de uma nova realidade, temos que nos adaptar a uma nova realidade. No final, a competência do profissional é ele que faz. Seja no presencial ou online, se o aluno não tiver interesse, ele pode aprender agora e esquecer amanhã e não ser um bom profissional. Não é o método em si que vai revelar o bom profissional e sim o indivíduo e sua força de vontade. Vai de nós, educadores e governo buscar meios para auxiliar nesta educação da melhor forma nos adaptando a realidade.”, conclui.