Em tempos de inquietude e desinformação, Mário Wamser mergulha fundo em questões humanas e abraça as próprias dúvidas em seu novo disco, “Incertezão”. O lançamento do selo Sagitta Records traz a lírica afiada do cantor e compositor mineiro radicado no Rio de Janeiro, acompanhado de músicos experientes e outros letristas de destaque nacional – entre eles, André Prando, Mihay, Mari Blue, Marco Lobo, Federico Puppi e banda Dônica, cujo vocalista, Zé Ibarra, também aparece no single “Um só”. O disco já está disponível para audição nas principais plataformas de streaming de música.
Ouça “Incertezão”: http://smarturl.it/IncertezaoAlbum
Confira o faixa-a-faixa abaixo
Wamser amplia a sonoridade apresentada nos singles “Embriagar em BH”, “Engole com angu” e “Um só”, onde explorava contradições, desdenhava de discursos saudosistas e se entregava ao escapismo. Sem desmerecer o passado e mirando na contemporaneidade, o artista entrega um álbum que é um produto de seu tempo. Ao longo de 14 canções, as letras passeiam por questões íntimas e universais, melancólicas e irônicas, refletindo o contexto social e político atual.
Assista ao clipe “Embriagar em BH”: https://youtu.be/9pFlYI507Oc
Ao olhar para o panorama da sociedade, Mário provoca contrapontos sem se propor dono da verdade. Após expor a mercantilização da fé (“Putrefato”), a superficialidade dos relacionamentos humanos (“Balada”), o fim do debate entre diferentes pólos políticos (“Vou Mitando”) e abusos psicológicos sofridos por mulheres (“Gaslight”), ele aceita o desconhecido e sentencia: nem tudo é como imaginamos.
“‘Incertezão’ é uma palavra inventada que vem trazer o sentido de uma grande incerteza, e ao mesmo tempo um tesão pela dúvida”, traduz Mário, que divide a produção do disco com o violoncelista Federico Puppi, indicado ao Grammy Latino pelo álbum “Guelã”, de Maria Gadú.
“Incertezão” vem para somar a uma trajetória já de destaque na música nacional. Após passar pela Bituca Universidade de Música, apadrinhada por Milton Nascimento, Wamser chamou atenção de artistas como Ivan Lins, Humberto Gessinger e Toninho Horta. Em 2014, o cantor e compositor lançou o disco de estreia, homônimo, em que explora as influências e sonoridades mineiras, com harmonias elaboradas.
Ouça “Mário Wamser”: https://spoti.fi/2rwGoaC
Em 2017, no WebFest Valda, já apresentava a canção “Putrefato”, presente em “Incertezão”, com a qual recebeu diversos prêmios, entre eles o de Melhor Guitarrista e segundo lugar geral. A música foi escrita por ele e interpretada por Mari Blue (que ganhou a premiação na categoria Melhor Voz).
Atualmente, Mário Wamser trabalha como artista e produtor musical. Seu portfólio inclui nomes como Duda Brack, Elisa Fernandes, João Bernardo, Tuca Oliveira, Renato Piau, entre outros. Sua experiência como intérprete levou-o a participar ao lado de Duda Brack do tributo a Luiz Melodia no Circo Voador, ocasião em que dividiu o palco com artistas como Frejat, Alceu Valença, Elba Ramalho, Geraldo Azevedo, e outros. Sua parceria com Federico Puppi rendeu em 2018 a composição “Capitão do Mar”, que ganhou a voz de Milton Nascimento e foi lançada no disco de Puppi, “Marinheiro de Terra Firme”.
Outra parceria que ressurge em “Incertezão” é com André Prando. Após aparecer na faixa “Musa dos Cetáceos”, presente no álbum “Voador” lançado pelo artista capixaba no final de 2018, é a vez de Wamser convidar Prando em “Nada pra comemorar”, uma divertida ode ao ócio e à autopiedade.
Recebendo ainda a participação de instrumentistas convidados como Marco Lobo (percussão), Miguel Miguima (baixo), Lucas Nunes (sintetizador, guitarra) e Pedro Aristides (trombone), “Incertezão” é um álbum construído a muitas mãos que estabelece Mário Wamser como uma voz de frescor e inovação no cenário da nova MPB.
O disco é um lançamento Sagitta Records e já está disponível nas principais plataformas de música.
Ficha técnica
Produzido por Federico Puppi e Mário Wamser
Gravado e mixado no estúdio Ouvido em Pé
Masterização: Eleven Mastering
Selo: Sagitta Records
1 – Divã (Mário Wamser)
Mário Wamser – Violão, Percussão, Guitarra, Voz
Federico Puppi – Cello, Baixo, Programações
2 – Gaslight feat. Dônica (Mário Wamser)
Mário Wamser – Violão, Voz
Zé Ibarra – Voz
Federico Puppi – Cello, Bateria, Programações
Miguel Miguima – Baixo
Lucas Nunes – Sintetizador, Guitarra
Marco Lobo – Percussão
3 – Comigo Mesmo (Mário Wamser)
Federico Puppi – Bateria, Cello, Baixo, Sintetizador, Teclado
Mário Wamser – Voz, Guitarra, Violão
4 – Um só feat. Zé Ibarra (Mário Wamser/Tulio Lima)
Mário Wamser – Voz, Guitarra, Teclado
Federico Puppi – Bateria, Baixo, Cello
Zé Ibarra – Voz
5 – Overblue (Mário Wamser/Mari Blue)
Mário Wamser – Bateria, Voz, Violão, Baixo, Teclado
Federico Puppi – Sintetizador, Programações
6 – Putrefato (Mário Wamser)
Federico Puppi – Cello
Mário Wamser – Voz, Guitarra, Baixo, Teclado, Bateria
Mari Blue – Programações
7 – Nada pra comemorar feat. André Prando (Mário Wamser)
André Prando – Voz
Mário Wamser – Voz, Guitarra, Baixo, Bateria, Teclado
Federico Puppi – Programações, Sintetizador
8 – Incertezão (Mário Wamser)
Mário Wamser – Voz, Violão, Baixo, Bateria, Teclado
Federico puppi – Sintetizador, Programações
Mari Blue – Backing vocals
9 – Engole com Angu (Mário Wamser)
Mário Wamser – Voz, Violão, Bateria
Federico Puppi – Programações, Baixo
Pedro Aristides – Trombone
10 – Embriagar em BH (Mário Wamser/Mihay)
Mário Wamser – Voz, Violão, Baixo, Bateria, Teclado
Federico Puppi – Cello, Programações
Mihay – Voz
11 – Cedilha (Mário Wamser)
Federico Puppi – Sintetizador, Cello, Programações
Mário Wamser – Voz, Violão, Guitarra, Teclado, Baixo, Bateria
12 – Balada (Mário Wamser/Mari Blue)
Mário Wamser – Voz, Guitarra, Bateria, Baixo, Teclado
Federico Puppi – Cello
Mari Blue – Programações
13 – Vou Mitando (Mário Wamser)
Mário Wamser – Voz, Teclado, Bateria, Sintetizador
Federico Puppi – Cello
Mari Blue – Programações
14 – Nem Tudo (Mário Wamser)
Mário Wamser – Voz, Bandolim
Mari Blue – Programações
Faixa-a-faixa, por Mário Wamser:
1 – Divã: A música que abre o disco tem a presença de alfaias, que trazem uma atmosfera séria junto à letra. Ela aborda a necessidade de não incitar a possível loucura presente nas pessoas, pela possibilidade de por pura e espontânea pressão elas sucumbirem em doenças psicológicas. Consta nela também um certo tom irônico ou cômico pessimista, como na frase “De van a gente vai divando pelo mundo até se encontrar num divã”, numa crítica à alegria histórica e ficcional muito presente nas redes sociais que acaba por embaçar a realidade.
2 – Gaslight (feat. Dônica): A faixa aborda o termo ‘gaslighting’, que é uma forma de abuso psicológico no qual informações são distorcidas, seletivamente omitidas para favorecer o abusador ou simplesmente mentiras são contadas com o intuito da vítima se confundir e até mesmo duvidar de sua memória ou de sua própria sanidade mental. ‘Gaslight’ é um filme de 1944 baseado em uma peça teatral que tratou deste assunto gerando o termo muito difundido atualmente dentro do feminismo por ser um tipo de abuso sofrido principalmente por mulheres. Além da banda Dônica, a faixa conta também com a presença de suma importância do percussionista Marco Lobo.
3 – Comigo Mesmo: O eu lírico futuro se encontra com o passado para avisar que as coisas mudaram e que deste posicionamento atual não terá mais volta. A música prepara um voo sonoro longo em sua cauda com a presença de vozes e cellos reverberando uma sensação de continuidade.
4 – Um Só (feat. Zé Ibarra): “Um só” é uma das faixas mais enigmáticas deste álbum, com uma construção bem mais abstrata do que as outras. Num belo dia, eu liguei pro Túlio Lima, banda Daparte, de Belo Horizonte, pra saber o que estava fazendo, daí ele disse: ‘agora me interrompeu enquanto eu estava fazendo essa música, termine ela aí, deve ser um sinal.’ Adoramos o resultado. Essa faixa tem um poder de comunicação assustador, apesar de se elaborar metaforizando. Desde os primeiros momentos em que toquei “Um Só” em lives na internet, as pessoas reconheceram e passaram a esperar essa música em todo lugar que eu ia. Basicamente uma música que se chama Um Só, que nasceu a dois e que é um advento de uma interrupção. Interessante como nascem as artes, né?
5 – Overblue: O álbum possui palavras inventadas em várias músicas, e uma delas é Overblue. A música é uma parceria minha com a cantora e compositora Mari Blue que desenvolve um texto confundindo o passado e o futuro, expondo uma tentativa de retorno que se mostra impossível.
6 – Putrefato: Uma música direta que expõe minha insatisfação com certos moldes de opressão ainda vigentes e velados para oprimir determinados grupos, muitas vezes em nome de um Deus, envolvendo também atividades financeiras e relações grandiosas de poder. O arranjo dá início a uma área mais rock n’ roll do disco, ressaltando a acidez e densidade da composição.
7 – Nada pra Comemorar: Contando com a ilustre participação de André Prando, essa faixa traz uma estética elétrica e suja, lembrando minhas influências desde o rock dos anos 70 ao grunge. Ela aborda o tédio como fator motor da criação, do movimento, como por exemplo na frase “tédio é o que te move”.
8 – Incertezão: Mais uma palavra inventada que veio dar nome ao álbum por sua representatividade em todas as outras faixas. Incertezão é ”a grande incerteza, a mega incerteza”, e é também um tesão pela dúvida.
9 – Engole Com Angu: Eu particularmente me encaixo no mundo de acordo com o ano que eu estou, e não com os que já passaram. E percebo que isso não é uma desconsideração do que foi feito lá atrás, e tão pouco uma ode ao novo, é apenas uma questão de observar um pouco mais o seu tempo real, o que você se encontra, e ouvir de fato o que está sendo dito nele. Essa música fala muito sobre isso. É um convite para as pessoas viverem numa mesma data, no presente, um convite a viver a contemporaneidade, qualidade ou condição de ser contemporâneo, de existir ao mesmo tempo, coexistir apesar de suas datas de nascimento. A expressão “engole com angu” é muito utilizada em Minas Gerais em contextos vingativos. O angu sempre ajuda a engolir o que você não está afim de engolir.
10 – Embriagar em BH: Essa música surgiu de uma parceria com Mihay. Já pensávamos em fazer essa parceria há um tempo, e num belo dia , fui até a casa do Mihay e falei com ele que eu tinha uma frase apenas, mas que poderia ser o start para uma música. A frase era ‘Embriagar em BH’ pela sonoridade fácil. Essa frase estava na minha cabeça há anos, e assim começamos a desenvolver a música. Me lembro de dizer ao Mihay: ‘olha, você não sabe, mas eu acho que a gente acabou de fazer o hit da nossa vida’. Quanta pretensão minha! Mas eu acho mesmo.
11 – Cedilha: Cedilha trabalha a possibilidade de com poucos recursos, com pequenos desvios, você mudar totalmente de concepção. O quanto isso pode ser genial e o quanto isso pode ser perigoso. Como no trecho da letra “De forca pra força, me basta cedilha, me basta um descuido pra sair da trilha”. A capacidade de uma coisa significativamente positiva como a força, num descuido, no esquecimento da cedilha, se tornar uma forca e vice-versa,
trazendo assim um tom metafórico de que tudo pode estar muito próximo da gente através de pequenas ações, de pequenos detalhes importantíssimos para que uma coisa não se torne outra completamente diferente.
12 – Balada: É a segunda parceria com Mari Blue no álbum Incertezão. É uma balada, mas o nome também faz referência à conotação atual que a palavra tem entre a juventude, e esse último significado é abordado na letra de forma crítica e poética. O “eu” da música se encontra desconfortável em uma festa que apresenta relações fúteis e efêmeras demais , sorrisos falsos e fragilidades humanas travestidas de euforia e alegria, sendo esse lugar quase sempre o refúgio psicológico de muitas das pessoas da minha geração. A música também faz um convite ao “cair das máscaras”, ao abandono de nossas futilidades, apontando também a inutilidade de “ter que ser alguma coisa” e retirando também o protagonismo do “eu”.
13 – Vou Mitando: Uma música que mostra o adoecer de uma sociedade que aposta em heroísmos e cria mitos como soluções fáceis, como se assim fosse possível. Uma sociedade que abandona a necessidade de discussão, que afasta o diálogo e a complexidade que é participar de forma madura de uma democracia. Uma música que aponta também as injustiças e a cortina de fumaça que é usada para não ter que lidar com esses temas, muitas vezes caindo nas remediações ou até mesmo na dificuldade que as pessoas têm de elaborar um pouco mais o pensamento crítico.
14 – Nem Tudo: Após todos os discursos presentes no disco, essa faixa vem apaziguar as questões, colocando todo o álbum em dúvida, dizendo que nem tudo é bem assim como pensamos, numa letra bem extensa e intensa, com sonoridade simples e com poucos elementos, contrária ao resto do disco. Com apenas bandolim e voz, ela vem trazer com sobriedade a existência e o reconhecimento do movimento pendular das escolhas das pessoas.