“Não canto muito bem, é por isso que toco baixo”, diz Kinga Glyk. Essa afirmação soa bastante suspeita, considerando o hype que a cercou nos últimos dois anos. E, no entanto, com essas palavras, a baixista polonesa resume sucintamente o que é o novo álbum de trabalho, “Feelings”. Com arte e indiferença incomparáveis, ela deixa o baixo contar histórias. Sensível e penetrante, rica em nuances e forte em grooves, ela evoca sentimentos. Eles tocam os ouvintes de Kinga Glyk, evocam histórias pessoais e refletem a personalidade dessa jovem extremamente talentosa. Depois, há a coragem dela de experimentar, de tentar algo novo, de se tornar feliz contra todas as regras.
“Quando criança, eu estava interessada no baixo, porque me dava uma voz extraordinariamente poderosa que eu não tinha na época”, reflete Kinga sobre o início da carreira como instrumentista. “Enquanto isso, os sons se tornaram minha língua real, na qual eu posso expressar meus sentimentos com muito mais intensidade”. Sem dúvidas. Mas, o baixo não tem a ver com ir mais alto, mais rápido, mais longe. Kinga Glyk não toca música para músicos, mas para as muitas dezenas de milhares de almas que tocou no curso da ainda jovem carreira com as histórias no baixo. Histórias que revelam a visão da artista extremamente aberta, amorosa e compassiva do mundo. Em suma, as doze faixas do novo projeto são intrinsecamente humanas. E é isso que torna “Feelings” tão único.
Kinga Glyk descreve “Feelings” como o trabalho mais pessoal até hoje. Uma olhada na lista de autores das novas faixas revela o porquê: sete músicas foram escritas exclusivamente por ela, duas que ela escreveu junto com o pianista e produtor que a acompanha, Pawel Tomaszewski. “Em contraste com o meu último álbum ‘Dream’, minha banda e eu não improvisamos no estúdio”, Kinga descreve a criação de “Feelings”. “Antes de começarmos a gravar desta vez, eu havia elaborado minhas composições com mais detalhes”. Não que a música de Kinga pareça muito cerebral como resultado. Pelo contrário, na música de abertura “Let’s Play Some Funky Groove”, ela cria muitos momentos emocionantes para aquecer as coisas. Os dedos da baixista mal ficam parados, querem encaixar-se na batida durante a interpretação evocativa e orgânica do som de “Minneapolis”, antes que a peça siga bem no meio para viver o drum’n’bass. “Lennie’s Pennies”, originalmente de Lennie Tristano, se torna um monstro de groove na interpretação de Kinga, revelando um trio na essência: solos brilhantes, improvisação refrescante sem clichês de improvisação livre e interpretação do grupo. O tecladista de Marcus Miller, Brett Williams, incendeia o funk “Joy Joy” junto com Kinga e quebra o chicote com o rock’n’roll jazzístico em “Mercy” (Duffy). O tecladista e autoproclamado “artista de dance music” Anomalyie, de Montreal, dá uma forma descolada aos “5 Cookies” de Kinga com um riff “Superfreak” (James Rick).
Em “What Is Life”, a peça central de “Feelings”, Kinga Glyk pergunta: “quem seríamos sem sentimentos? Eles nos deixam experimentar muito, eles nos ensinam, às vezes trazendo dor, às vezes alegria. Emoções – sem elas, estaríamos vazios. As palavras nem sempre são capazes de expressar nossos sentimentos … mas a música é”. A introdução, com palavras faladas, é seguida pela versão musical da experiência tornada crença. Ela combina a abordagem livre do jazz com momentos narrativos de tirar o fôlego baseados alternadamente em R&B e folk.
A jornada do novo álbum de Kinga, “Feelings”, termina com “Enu Maseti”, com a colaboração do brasileiro Mateus Asato e Ruth Waldron, uma balada em linguagem de fantasia que, mais uma vez, incorpora a singularidade deste álbum: grandes emoções não contradizem a improvisação; de fato, elas incentivam a liberdade e rompem com a convenção. Há já algum tempo, Kinga Glyk tem sido um modelo nesse sentido. Por cerca de dois anos, ela atraiu a atenção de fãs, produtores de TV e rádio, usuários do YouTube, periódicos e organizadores de festivais e clubes. Você literalmente fica arrepiado quando ela puxa e toca as cordas de aço de seu baixo. E não tanto porque essa solista imensamente talentosa é uma jovem em um círculo de instrumentistas dominado por homens, mas porque Kinga Glyk exemplifica a autonomia no baixo. E “Feelings” é o ápice temporário de seu trabalho.
Confira a tracklist completa de “Feelings”:
- Let’s Play Some Funky Groove
- Lennie’s Pennies
- Joy Joy (feat. Brett Williams)
- Intro to What Is Life
- What Is Life
- Mercy (feat. Brett Williams)
- OverDrive
- Ballada (feat. Brett Williams)
- Low Blow
- Classic (feat. Bobby Sparks II)
- 5 Cookies (feat. Anomalie)
- Enu Maseti (feat. Mateus Asato & Ruth Waldron)
* Todas as músicas são compostas por Kinga Głyk, exceto “Low Blow” (Victor Bailey),
“Lennie’s Pennies” (Lennie Tristano) e “Mercy” (Duffy)
KINGA GŁYK – baixo elétrico
PAWEŁ TOMASZEWSKI – teclados
CALVIN RODGERS – bateria
BRETT WILLIAMS – teclados (3, 6, 8)
JOACHIM MENCEL – hurdy gurdy (4, 5)
SŁAWEK BERNY – percussão (3, 5, 6, 7, 8, 11, 12)
ANOMALIE – teclados (11)
BOBBY SPARKS II – teclado solo (10)
RUTH WALDRON – vocal (12)
MATEUS ASATO – guitarra elétrica (12)