Por Felipe Kury

Uma das principais conclusões que surgiram durante a recente reunião da COP27 (Conference of the Parties), no Egito, foi que, para limitar o aquecimento global em 1,5°C e alcançar o “net-zero emissions” até 2050, os países precisam de um grande esforço global e coordenado para acelerar a transição energética e a utilização de materiais sustentáveis – além de intensificar o uso de tecnologias para captura, uso e armazenamento de carbono (Carbon Capture Utilization and Storage – CCUS) em escala global.

Nada simples. Talvez, um dos maiores desafios para a humanidade no momento, que exige sensibilidade e coordenação global para revolucionar toda a economia física. Sabe-se que, desde a primeira reunião da COP1, em março de 1995, em Berlim, na Alemanha, ou seja, 27 anos atrás, o mundo vem se esforçando para desenvolver políticas climáticas para proteger o meio ambiente e, ao mesmo tempo, tentando promover políticas econômicas de crescimento sustentável.

Entretanto, apesar dos esforços de quase três décadas, foi somente a partir da COP15, em 2015, em Paris, que o mundo começou a perceber as graves implicações climáticas e socioeconômicas para a humanidade, no caso de não agir. Desde então, percebe-se um maior engajamento, principalmente das nações mais desenvolvidas, com várias ações coordenadas no âmbito global para a compreensão dos fenômenos de mudanças climáticas e a criação de instrumentos para combater o avanço das emissões de gases de efeito estufa (Greenhouse Gas Emissions – GHG).

Assim, instrumentos de precificação de emissões de carbono foram desenvolvidos para apoiar políticas públicas com o objetivo de mitigar as emissões e permitir condições de crescimento econômico sustentável. Entre os instrumentos mais utilizados pelos países, atualmente, temos: imposto sobre emissões de carbono, sistemas de comércio (Emissions Trading Systems – ETS) e mecanismos de créditos de carbono.

Inúmeras pesquisas indicam que uma política fiscal bem estruturada (tributação e/ou incentivos) sobre emissões de carbono, tem impacto significativo na redução de emissões de GHG, principalmente, considerando que as emissões de carbono representam quase 80% das emissões de GHG. Desta forma, a redução de emissões de carbono pode, efetivamente, mitigar os efeitos nas mudanças climáticas.

E, mais importante, a estruturação do mercado de créditos de carbono parece ser a ferramenta de política climática e de desenvolvimento econômico mais efetiva. Contudo, cabe destacar que a estruturação deste mercado é complexa, necessita ter coordenação e consistência global, regras de qualidade, fiscalização e precificação adequadas, garantindo assim a sua adoção, credibilidade e liquidez.

Um estudo da Mckinsey&Company, apontou que o Brasil, por ter abundância de recursos naturais, tem a possibilidade de alcançar uma participação de 15% no mercado global de crédito voluntário de carbono – onde não existe uma obrigação por lei – equivalente a cerca de USD$ 2 bilhões até 2030. Empresas de diversos setores da economia, como indústria, agronegócio, cosméticos, commodities, entre outros, vem se mobilizando com o objetivo de participar ativamente deste mercado.

Adicionalmente, o mesmo relatório sugere que, para atingir este potencial, o Brasil deveria aumentar em, pelo menos, dez vezes a oferta de créditos de carbono para compensação de emissões. Para isto, necessita investir mais em preservação de florestas, principalmente na região amazônica, onde ocorre 80% do desmatamento do país. É preciso investir no reflorestamento de áreas degradadas, fazer uma reforma na legislação da propriedade da terra, além de criar incentivos para uso de fontes de energia com menores emissões de GHG, com maior utilização de energia de fontes renováveis.

O Brasil pode ser protagonista nessa transição, especialmente, em função de seus recursos e capacidades naturais. Segundo o estudo, existem três caminhos associados à economia verde em que o Brasil pode assumir um papel de liderança: energia renovável, energia de biocombustíveis e mercado de créditos de carbono.

Reunidos, estes três caminhos representam uma oportunidade de mais de US$ 125 bilhões até 2040, onde a energia renovável representa US$ 31 bilhões (sendo hidrogênio verde com US$ 20 bilhões), energia de biocombustíveis US$ 59 bilhões e mercado de crédito de carbono US$ 35 bilhões.

Além disso, estes mercados podem oferecer inúmeros outros benefícios diretos e indiretos, com impacto significativo no desenvolvimento socioeconômico de diversas regiões do país, além de promover mais segurança hídrica e proteção da biodiversidade. Portanto, o Brasil tem uma oportunidade única de acelerar o crescimento socioeconômico inclusivo e sustentável, ao mesmo tempo em que pode assumir um papel de liderança na descarbonização da economia global.

Conforme mencionado, a estruturação do mercado de créditos de carbono, por si só, não é suficiente para prevenir a mudança climática, devendo haver um conjunto bem mais amplo de ferramentas de estratégias de desenvolvimento econômico sustentável. Em especial, a criação de políticas públicas que promovam a transição para uma economia de baixa emissão de carbono – revolução da economia física. Acima de tudo, existe a necessidade de um maior engajamento global coordenado, fundamental para alcançar resultados tangíveis, conforme sugeridos pela COP27.

Há quase um século, o cientista Albert Einstein já mencionava sua preocupação com a forma como a humanidade se relacionava com o meio ambiente, em especial, quando externou preocupação com os efeitos das reações na mecânica quântica: “Deus não joga dados com o universo, mas a humanidade está jogando dados com o meio ambiente por meio de uma infinidade de intervenções”.

Assim, até que a humanidade assimile completamente as consequências de não agir de forma decisiva, coordenada e em âmbito global, as políticas de mudança climáticas terão efeito limitado na proteção do meio ambiente e da própria humanidade.

Felipe Kury é ex-diretor da ANP – Agência Nacional de Petróleo e consultor independente.