Fabiano de Abreu, que é psicanalista, neurocientista, neuropsicólogo e filósofo, explica que a ansiedade é um mecanismo de defesa do cérebro contra possíveis ameaças, o problema estaria no descontrole desta emoção

Não viver o presente por medo do que supostamente poderá acontecer, até que o “futuro” chega e nada acontece, a pessoa então fica frustrada por não ter feito o que deveria no tempo certo e passa a se sentir mais ansiosa com seus afazeres, agora somados com medo que ela já tinha do futuro. O ciclo da ansiedade é um mal presente nas sociedade contemporânea, “a ansiedade faz desperdiçar o presente por medo do futuro”, afirma o neurocientista, neuropsicólogo, psicanalista e filósofo Fabiano de Abreu. No entanto, saber dosá-la pode ser benéfico.

Ele define a ansiedade como uma pendência, uma fuga da realidade, do presente e de tudo o que é verdadeiro. O ansioso se agarra a pensamentos fantasiosos em vez de se prender ao que concretamente tem naquele momento. “É uma necessidade de ter que resolver algo, esse desejo faz parte do instinto de sobrevivência, mas o que nem sempre fica claro é o que precisa ser resolvido”, define Abreu. O resultado, de acordo com o especialista, é o sentimento de impotência. No entanto, a ansiedade pode ser dosada e usada de maneira que seja uma mola propulsora. Fabiano de Abreu explica que a preocupação com o futuro vem da região mais primitiva do cérebro, aquela em que são armazenados os traumas, a negatividade, os medos e a consciência da fuga da realidade. “Isso é necessário para que possamos ‘nos salvar’, afinal, era na ansiedade que buscávamos a pulsão necessária para fugir do perigo desde os primórdios”, afirma.

Assim, o psicanalista define este sentimento como um recurso interno que busca memórias de medo para que a pessoa possa se defender ou buscar uma solução rápida. Um exemplo prático é o estudante que já foi mal na prova anterior e sabe que se for mal na próxima terá outra nota baixa e poderá ser reprovado, então ele estuda muito mais para evitar passar novamente pela sensação de fracasso.”Podemos dizer que essa é a razão dessa memória do medo permanecer em nós todos”, destaca. O problema atual é que as pessoas não tem dosado e usado de forma racional este recurso. “Estamos muito ansiosos hoje em dia porque temos já tantas pendências e ainda criamos diariamente mais”, destaca. São as contas que chegam, o desejo de adquirir o smartphone recém lançado, ver que ainda não conseguiu guardar dinheiro para o futuro, ter medo de não bater a meta do mês no trabalho, achar que precisa trocar de carro e diversos outros pensamentos que se forem analisados friamente não são urgentes ou difíceis de resolver. No entanto, é difícil analisar racionalmente, pois ao temer não conseguir cumprir as pendências e carregar o desejo de ter que solucionar tudo, o cérebro resgata as memórias negativas,que colocam o indivíduo em uma atmosfera pesada, isso faz o medo aumentar ainda mais.

As pendências são fruto das situações já vivenciadas, mas que não foram resolvidas. “Muitos conflitos emocionais que negligenciamos ao longo do tempo, que acreditávamos já ter superado, mas acabam ressurgindo de tempos em tempos para nos mostrar que não estamos no controle”, explica Abreu. Portanto, é crucial buscar ajuda profissional para olhar o presente com mais confiança, assim será possível evitar que o medo atinja níveis incapacitantes, “Poderá acontecer no futuro um estado de pânico que te dominará e você não perderá o controle de tudo, inclusive de você mesmo”, alerta. O resultado poderá ser quadros de Depressão ou até mesmo Síndrome do Pânico.

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Setembro Amarelo: locais gratuitos ajudam a salvar vidas

Preocupado com a saúde mental em tempos de confinamento, o neurocientista, neuropsicólogo e psicanalista Fabiano de Abreu fornece informações sobre terapias gratuitas para quem não têm condições financeiras 

O acesso a tratamentos psicológicos ainda é restrito a quem pode pagar, o que corresponde a uma minoritária parcela da população. Com o objetivo de mostrar que atendimento psicológico não deve ser artigo de luxo e que pode salvar vidas, locais oferecem tratamento gratuitos a pessoas de baixa renda. Arlete Sousa, de 41 anos, buscou atendimento gratuito no Instituto Gaio, em São Paulo, um dos locais que oferece consultas a quem não pode pagar. “No início da pandemia comecei a ter muito medo e não conseguia mais nem colocar os pés para fora de casa, com medo de morrer ou perder quem eu amo”, revela a paciente. Com o tratamento ela pode ser diagnosticada com depressão de Transtorno de Ansiedade e receber tratamento adequado para lidar com a situação, “recomendei o serviço para minha cunhada também, que perdeu uma pessoa muito próxima e não estava conseguindo superar o luto”, conta. 

Dona Arlete foi atendida pelo mestrando em psicanálise Fabiano de Abreu. Em institutos e cursos de psicologia, mestrandos e doutorandos oferecem o serviço como parte de sua formação, assim, os pacientes recebem atendimento gratuito de profissionais já qualificados e os profissionais têm a oportunidade de se desenvolver. “Durante meu mestrado tive a oportunidade de atender diversos pacientes de todos os perfis”, afirma Abreu. A depressão é uma das principais doenças que levam ao suicídio no mundo. Para ele a experiência foi tão rica que continuou atendendo mesmo após o mestrado pessoas sem condições de arcar tratamentos convencionais. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) revelam que a cada 40 segundos uma pessoa comete suicídio no mundo. No Brasil, são 12 mil suicídios por ano em média. Esta é a segunda principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos no planeta, estando atrás apenas dos acidentes de trânsito. Segundo a OMS, o Brasil é o campeão mundial em casos de transtorno de ansiedade e ocupa o segundo lugar em transtornos depressivos, que podem levar ao suicídio.