Foto: TFN

Pela primeira vez, espetáculo será realizado em um teatro, com Jesus negro e referências contemporâneas. Apresentações serão de 16 a 18 de outubro, no Teatro Luiz Mendonça, Parque Dona Lindu

A história mais conhecida de todos os tempos ainda pode trazer surpresas e novidades para o público? De acordo com a nova versão do diretor Carlos Carvalho, sim. Dos dias 16 a 18 de outubro, no Teatro Luiz Mendonça (Parque Dona Lindu, Boa Viagem), terá início uma nova fase da Paixão de Cristo do Recife: Jesus, A Luz do Mundo. Após uma experiência no universo audiovisual durante a pandemia, com a adaptação do espetáculo para sua estreia no cinema, o público poderá vivenciar a trama de uma forma inédita: dentro de um teatro, com uma proposta que desmistifica o Cristo eurocentrado e traz adaptações que mesclam referências históricas e contemporâneas.

A entrada será 1 kg de alimento não perecível. Para a estreia (dia 16), serão disponibilizados 400 ingressos. As sessões dos dias 17 e 18 terão na plateia estudantes de escolas públicas do Governo do Estado, sendo ofertados cem bilhetes, por apresentação, para o público em geral. Os tíquetes para todas as sessões devem ser resgatados na bilheteria do Teatro Luiz Mendonça, às 17h do dia 16 de outubro.

O fato de acontecer – pela primeira vez em mais de 20 anos – dentro de um espaço delimitado traz novidades intrínsecas ao novo formato: a proximidade do público permitirá que as vozes dos artistas ecoem sem a necessidade da dublagem e recursos audiovisuais. O texto será declamado ao vivo, sem gravações.  “Estar em um teatro favorece bastante essa conexão com o público, pois tudo é vivo, plateia e artistas estão em plena sinergia. O olhar é vívido. Essa interação se faz essencial para a nova montagem, que traz uma experiência mais intimista e envolvente com a história de Cristo”, afirma o diretor, Carlos Carvalho.

Em sua 24ª edição, Paixão de Cristo do Recife: Jesus, A Luz do Mundo traz outras novidades. O texto foi modificado para dar mais relevo a aspectos da atualidade e há, também, variações na estética e no elenco para dar suporte a esta configuração. O texto traz referências, de forma indireta e adaptada a trechos bíblicos, a temas como o drama dos refugiados ao redor do mundo, práticas vigentes das igrejas neopentecostais, aos mercadores da fé e à subversão do entendimento entre fé e poder público. “No Sermão da Montanha, por exemplo, Jesus se autoproclama refugiado, pois teve que ser levado ao Egito, ao nascer, visto que Herodes pretendia matar todas as crianças com até cinco anos de idade nascidas em Jerusalém. O personagem afirma ser tratado como estrangeiro em sua terra natal”, relata o diretor, que aponta ainda adaptações em cenas como a dos vendilhões do templo.

ELENCO – O elenco de 30 personagens também vem renovado. No papel do protagonista, o ator negro, recifense, com origens interioranas, Asaías Rodrigues (Zaza). Ele é estreante na Paixão de Cristo do Recife, mas traz vivências com outras versões do espetáculo. “Em 2009, fui convidado pela ilha de Fernando de Noronha para dirigir a Paixão de Cristo de lá. Uma grande experiência, visto que minha ligação com essa energia ‘crística’ é imensa. A missão de um ator, na história do teatro, é parecida com a de Cristo: um sacrifício explícito, porque o público quer ver em nós o que já aconteceu na vida Dele, o que acontece, ou como poderia ser se viesse a acontecer. O ator é uma espécie de rato de laboratório, de cobaia”, analisa.

Ainda sobre suas experiências, Zaza conta que neste mesmo espetáculo de Fernando de Noronha também fez o papel de Judas. “O de Jesus interpretei depois, em um Auto de Natal promovido pela igreja das Fronteiras, que propunha uma releitura moderna sobre o seu nascimento. Agora, Ele volta a minha vida, dessa vez na famosa Paixão de Cristo do Recife. Então imagine como estou me sentindo interpretando o papel do maior revolucionário da história? Em êxtase! Além disso, estou muito orgulhoso de ocupar o lugar de um mestre como José Pimentel”, afirma Zaza.

Sobre o fato de ser a primeira vez que a Paixão traz o protagonista interpretado por um ator negro, Zaza afirma que é neste contexto que entra a sua parte “rebelde”, como denomina. “Eu sou um ser vivo e não me defino por cor, sexo, classe social ou religião. ‘Eu sou o sal da terra, eu sou a luz do mundo’ como o mestre quis que assim o fôssemos. Trazê-lo assim, em pleno 2022, num momento histórico, político, social, econômico e cultural, isso sim que é falar de cor, uma cor única, o vermelho do coração que pulsa igual no peito de qualquer que seja o ser humano que temos diante de nós”, destaca o ator.

Assim como Isaías, negra também será a atriz que dará vida a Maria, a pernambucana Gheuza, que interpretou Madalena no filme de 2021. Estas duas personagens, inclusive, representam uma troca de papéis entre as intérpretes, já que Angélica Zenit será a Madalena, no teatro, enquanto deu vida à mãe de Jesus, na película. Outros destaques no elenco são a presença de Douglas Duan como Caifás, e Marcos Brandão, interpretando Herodes em sua estreia na Paixão.  Na assistência de direção e iluminação está Eron Villar e na sonoplastia, o maestro da Orquestra Sinfônica do Recife, José Renato Accioly.

FIGURINO – A estética do espetáculo também vem com novidades ao trazer para a cena um diálogo entre figurinos típicos da época e contemporâneos. “Os sacerdotes, por exemplo, estarão vestidos com paletó e carregando bíblias. Os figurantes, por sua vez, emprestarão suas roupas próprias e cotidianas para que possamos customizá-las, sempre no contexto da atualidade. Herodes também virá mais despojado, à vontade”, adianta o diretor.

Todas estas modificações em relação às apresentações anteriores são, de acordo com Carlos Carvalho, uma espécie de ensaio para 2023, quando pretende levar o espetáculo de volta para o Marco Zero. “Trata-se de um grande ensaio para experimentar este retorno ao local de origem no qual não pudemos estar, neste ano, por dificuldades de captação de recursos”, explica Carlos, informando que a montagem atual, feita com R$ 220 mil, teve todo o financiamento a cargo do Sistema de Incentivo à Cultura (SIC) da Prefeitura do Recife.

Quanto à reação do público a todas as novidades implementadas, Carlos acredita que encontrará uma plateia dividida. “Provavelmente, o público mais religioso possa estranhar, visto que vai de encontro à imagem criada pela religião católica há 2 mil anos. De forma geral, entretanto, acredito que haverá um bom impacto. Até porque não estamos inventando nada. Ariano Suassuna já representou um Deus negro em O Auto da Compadecida. Contar esta história desta forma, no teatro, é levar para as pessoas uma atividade presencial que proporciona a troca de energia instantânea, imediata e ainda mais próxima e instigante”, finaliza.


FICHA TÉCNICA – Realizado pela Associação dos Produtores de Artes Cênicas de Pernambuco (Apacepe), com incentivo da Prefeitura do Recife, por meio do Sistema de Incentivo à Cultura (SIC), da Secretaria de Cultura do Recife e da Fundação de Cultura Cidade do Recife, Paixão de Cristo do Recife: Jesus, a Luz do Mundo tem direção e roteiro de Carlos Carvalho.  A produção geral é de Paulo de Castro Produções e Antônio Pires, com produção executiva de Cordas Cênicas, Roda Cultural, P. Castro e Thays Melo, e assistência de produção de Lisandra Batista, Sayonara Silva e João Pedro Pinheiro. Álcio Lins assina os figurinos, a iluminação é de Eron Villar, que também ocupa a assistência de direção. A direção de trilha sonora é do maestro José Renato Accioly. A montagem conta com apoio da Secretaria de Educação do Governo do Estado, Cepe, TV Pernambuco, TV e Rádio Universitária e Brotfabrik.

SERVIÇO:

24ª Paixão de Cristo do Recife: Jesus, A Luz do Mundo

Teatro Luiz Mendonça: Parque Dona Lindu, Boa Viagem – Recife/PE

Dias 16, 17 e 18 de outubro (domingo: 18h | segunda e terça: 20h)

Classificação livre

Ingressos: 1 kg de alimento não perecível a ser trocado na bilheteria do teatro às 17h do dia 16 de outubro