Comportamentos nocivos à saúde têm levado ao aumento na taxa de tumores entre adultos nascidos nos anos 90

Estimativas do Centro Internacional para Pesquisa do Câncer (IARC), instituição internacional subordinada à Organização Mundial da Saúde (OMS), apontam que em 2018 teriam sido feitos mais de 18 milhões de diagnósticos de câncer no mundo, um aumento de cerca de 28% se considerado o levantamento anterior, de 2012, que indicava 14 milhões de casos reportados.

Divulgado em setembro do ano passado pela entidade, o relatório traz adicionalmente informações baseadas no recorte da população por gênero, indicando que um em cada cinco homens e uma a cada seis mulheres no mundo desenvolverá algum tipo de tumor maligno durante a vida. 

Diante deste cenário de contínua progressão da doença, a entidade destaca que é preciso atentar para a perigosa relação entre hábitos pouco saudáveis da nova geração e o potencial aumento nos índices de tumores entre o grupo de pessoas formado por aqueles que atualmente têm menos de 30 anos.

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“É preciso rever nossos hábitos de vida – ou a falta deles – para frear as estatísticas crescentes ano a ano. No Brasil o número de novos casos de câncer deve ultrapassar a marca dos 600 mil registros neste ano, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer (INCA). Por isso, o incentivo à prática constante de exercícios físicos, dieta equilibrada, consumo moderado de bebidas alcoólicas, não fumar e outras medidas simples devem ser entendidos como parte de uma política de saúde pública”, diz Eduardo Inojosa, oncologista da Oncoclínica Recife.

Para o também oncologista, Diogo Sales, da Multihemo, essas não são apenas iniciativas essenciais para frear os índices aumentados do câncer como uma maneira de promoção à qualidade de vida e bem estar geral, mas servem também como aliadas no processo de tratamento para pessoas diagnosticadas com a doença e outras condições como diabetes e hipertensão. Para reforçar essa percepção, Inojosa ressalta que sobrepeso e sedentarismo estão no topo dos fatores que afetam especialmente a saúde da geração de adultos nascidos nos anos 90.

“Millennials têm o dobro de risco de desenvolver câncer no cólon (segmento do intestino grosso) e quatro vezes mais chance de receberem um diagnóstico de câncer no reto em comparação à geração Baby Boomers, indivíduos com 55 anos ou mais, apenas para citar mais um exemplo dos malefícios do sedentarismo e da ingestão de alimentos pobres em vitaminas e fibras”, afirma o médico, citando o estudo recente sobre o tema feito pela Sociedade Americana de Câncer (ACS, sigla do inglês American Cancer Society).

E não são apenas os tumores intestinais que estão relacionados ao nosso comportamento diário. A obesidade já é tida como importante contribuinte para o aparecimento de ao menos outros onze tipos de câncer: esôfago, vesícula, fígado, pâncreas, rins, útero, ovário, mama, mieloma múltiplo, tireóide e próstata.

“Sedentarismo, consumo aumentado de carne vermelha, fast food, comida processada, álcool e cigarro são hábitos comuns entre os jovens que podem trazer malefícios à saúde. Se não atentarmos para os hábitos que colaboram para a redução do risco de câncer, teremos futuramente um contingente cada vez mais aumentado de pacientes nos consultórios oncológicos”, finaliza Diogo.

Mudanças de hábito simples

Abaixo, os especialistas listam os principais fatores que podem contribuir para o surgimento do câncer:

Tabagismo: Antigamente, o hábito de fumar era visto com elegância e glamour, sendo incentivado até pelas propagandas que mostravam atores famosos tragando seus cigarros, o que estimulava esse costume entre as pessoas mais jovens. O cigarro era liberado nos restaurantes e até na sala de aula.

Hoje, o uso do cigarro pela geração Millenials, na maioria das vezes, vem acompanhando de bebidas alcoólicas. Estimativas apontam que 75% dos casos de câncer de pulmão são decorrentes do uso do tabaco e os fumantes têm cerca de 20 vezes mais risco de desenvolver a doença. Além disso, o cigarro também é responsável pelo aparecimento do tumor na cabeça e pescoço.

Etilismo: O consumo exagerado de bebidas alcoólicas tem se mostrado um dos hábitos mais frequentes entre jovens adultos. Essa prática traz consequências para a saúde física, sendo um depressor do sistema nervoso central e gerando impactos nocivos a diversos órgãos, como o fígado, o coração e o estômago.

Uma pesquisa publicada no Alcohol and Alcoholism mostra que as consequências podem ser ainda maiores: segundo o periódico, basta uma dose de bebida alcoólica por dia para aumentar o risco das mulheres desenvolverem câncer de mama em 5%. A conclusão é parte de uma revisão de 113 estudos feita por pesquisadores da Alemanha, França e Itália. Para mulheres que bebem mais – três ou mais doses por dia – o risco de contrair a doença aumenta em 50%.

Sedentarismo: Pode parecer um pouco clichê relacionar a saúde com a prática de exercícios físicos diários, mas esse é um fator que pode diminuir bastante o risco de aparecimento da doença. Mais de um terço dos jovens brasileiros está acima do peso, de acordo com dados do Ministério da Saúde e, esse fato, leva a um risco maior de desenvolver doenças como colesterol alto, diabetes e hipertensão arterial.

Com o avanço da tecnologia, os jovens passam mais horas em frente ao computador, plugados no celular ou tablets, deixando de lado as atividades físicas. Mas com pequenos ajustes na rotina, como pequenas caminhadas diárias e subir e descer escadas ao invés de utilizar o elevador, é possível dar um salto na qualidade de vida e prevenir inúmeras doenças, não apenas o câncer. Arecomendação da OMS é que pessoas de 18 a 64 anos pratiquem pelo menos 150 minutos de exercícios moderados por semana – ou, em média, pouco mais de 20 minutos por dia.

Infecções Virais: A geração de jovens e adultos com menos de 30 anos preza e valoriza muito a liberdade sexual.  Trata-se de um grupo que nasceu após o “boom” do HIV e, apesar de bem informada e consciente dos riscos envolvendo doenças sexualmente transmissíveis, apresenta índices elevados de contágio pelo chamado papilomavírus humano – conhecido como HPV. Mais comum tipo de infecção sexualmente transmissível em todo o mundo, o vírus atinge de forma massiva a população feminina – 75% das brasileiras sexualmente ativas entrarão em contato com o HPV ao longo da vida, sendo que o ápice da transmissão do vírus se dá na faixa dos 25 anos.

Após o contágio, ao menos 5% dessas brasileiras irá desenvolver câncer de colo do útero em um prazo de dois a dez anos, uma taxa alarmante. O tumor já é considerado um problema de saúde pública no Brasil e faz parte do Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT) no país, o que inclui a vacinação contra o HPV para meninos e meninas com idades entre 9 e 26 anos. Além do HPV, existem algumas infecções virais que também podem estar relacionadas ao aparecimento do câncer. A hepatite B e C, por exemplo, podem desenvolver o câncer de fígado. Já o HIV pode ser responsável por tumores hematológicos como linfoma.

Exposição Solar: Os jovens estão acostumados a se prevenir contra o sol quando vão para a praia no verão. Porém, a exposição solar vai muito além, pois para pessoas que costumam ficar expostas aos raios solares, é preciso reforçar o uso do protetor diariamente, principalmente no rosto. Se a exposição for maior, como na praia ou piscina, por exemplo, é importante abusar do protetor no corpo todo, usar chapéus e evitar horários em que a incidência solar esteja mais forte.

Em geral, as pessoas costumam relacionar os casos de câncer de pele exclusivamente ao melanoma, mas 95% dos casos de tumores cutâneos identificados no Brasil são classificados como não melanoma, um índice que está diretamente relacionado à constante exposição à radiação ultravioleta (UV) do sol.

Obesidade: Embora o aumento da obesidade ocorra em todas as idades, os jovens foram os mais afetados. Isso ocorre pela ingestão exacerbada de alimentos ultra processados, pobres em nutrientes e também por conta do sedentarismo. 

Em alguns tipos de câncer, o excesso de peso corporal durante a vida adulta pode ser considerado como um fator para o surgimento da doença. Um estudo publicado pela The Lancenet Public Health sugere que as taxas de incidência de cânceres associados à obesidade estão aumentando mais rapidamente em jovens adultos entre 25 e 49 anos nos Estados Unidos. 

Dos subtipos existentes da doença, ao menos 14 têm seus riscos aumentados pelo sobrepeso e obesidade: mama, cólon, reto, útero, vesícula biliar, rim, fígado, ovário, próstata, mieloma múltiplo, esôfago, pâncreas, estômago e tireoide.